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- 18/03/2018
- redacao
A Engenharia brasileira enfrenta um momento crucial capaz de mudar o destino de milhares de profissionais da área. A redução ou falta de investimentos verificada nos dois últimos anos, assim como as novas concepções de políticas públicas propostas para o Brasil nos próximos anos estão comprometendo gravemente este cenário que se avizinha caótico no curto e médio prazo. Vários setores importantes para a economia e a manutenção do desenvolvimento no país tiveram seus investimentos reduzidos a quase zero. Vejamos o caso do saneamento básico (água e esgotos). Ainda hoje, 45% da população brasileira convive sem tratamento do esgoto e 70% dos 5.570 municípios têm tratamento de esgoto com, no máximo, 30% de eficiência. Assistimos passivamente à eliminação de investimentos e recursos para o setor, com a redução drástica de financiamentos no governo do presidente Michel Temer, promovendo o estrangulamento das empresas públicas da área.
Para se ter uma ideia dos cortes promovidos, o país vinha investindo uma média de R$ 9 bilhões por ano na rubrica saneamento, apesar dos estudos apontarem a necessidade de aplicação de recursos na ordem de R$ 25 bilhões ao ano para alcançar a universalização dos serviços até 2033.
Até mesmo a Sabesp, a maior empresa de saneamento da América Latina, vem passando por profundas transformações capazes de afetar o abastecimento de água, principalmente na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP). Devemos observar, ainda que, desde 2012, ela vem reduzindo drasticamente os investimentos em projetos. Naquele ano, a Sabesp licitou aproximadamente R$ 103 milhões nessa rubrica (projetos e consultoria), mantendo em R$ 105 milhões em 2013. Já em 2014, apenas R$ 73 milhões foram destinados para licitações de estudos e projetos, valor que caiu para R$ 12 milhões em 2015, em plena crise hídrica vivida pelo Estado. Em 2016, foram licitados apenas R$ 5,3 milhões para projetos. Em contrapartida, em 2016, a Sabesp obteve um lucro líquido de R$ 2,95 bilhões. Na contramão da forte redução dos investimentos em novos projetos e consultoria, os gastos da Sabesp com publicidade nesse ano foram de R$ 50,8 milhões, ou seja, quase 10 vezes mais que em licitações de projetos.
Para agravar este quadro, salientamos que, assim como outras estatais, para atender a demanda de novos empreendimentos, a empresa vem adotando a contratação por meio do Regime Diferenciado de Contratação de Obras Públicas (RDC), em vez de optar pela Lei nº 8.666/93. A principal deficiência dessa modalidade de contratação é deixar para uma mesma empresa todas as fases do empreendimento, desde os projetos até a entrega final do objeto de contratação. O RDC integrado traz ainda a possibilidade de contratação de estudo ou projeto de engenharia apenas por critérios financeiros, ou seja, pelo menor preço. As licitações que envolvem desenvolvimento tecnológico e expertise não podem ser conduzidas apenas por essa lógica. A economicidade de uma solução de engenharia deve considerar as três condicionantes: implantação, operação e manutenção, o que se obtém com estudos profundos e qualificados.
As consequências lógicas de todo este processo serão, além das perdas de tecnologia, as perdas econômicas e financeiras e de centenas de milhares de postos de trabalho de profissionais qualificados de nível superior e de nível médio. Em suma, regrediremos à primeira metade do século passado em termos de desenvolvimento tecnológico da Engenharia, com todos os prejuízos decorrentes do desmonte da Engenharia brasileira.
(*) Luiz Pladevall é presidente da Apecs (Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente) e vice-presidente da ABES-SP (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental).
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