STJ ATROPELA O LGISLATIVO E ASSUME A DECISÃO SOBRE O PLANTIO DE MACONHA NO BRASIL
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  • 29/03/2023 
  • redacao

A pressão econômica para a liberação do plantio da maconha (cannabis sativa) para fins diversos cresce no Brasil e corre o risco de ocorrer à revelia do Congresso Nacional, sem a consulta aos representantes eleitos pela população para analisar temas como esse. Na última semana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) assumiu o poder de decidir sobre a liberação da plantação de cannabis no país, em uma ação ajuizada pela empresa DNA Soluções em Biotecnologia, interessada no uso comercial da planta.

Para assumir o poder de decidir sobre o assunto, o tribunal deu seguimento a uma proposta de Incidente de Assunção de Competência (IAC). Um IAC é a declaração de que um determinado tema, relevante e de repercussão social, necessitaria de análise do colegiado do STJ para fundamentar decisões em outros tribunais no país.

Juristas recordam, no entanto, que o cultivo de qualquer variante da cannabis é proibido no Brasil pela Lei de Drogas (Lei 11.343 de 2006). Por isso, o único comportamento esperado do tribunal, de acordo com a lei, seria confirmar o veto ao cultivo. A análise do caso por meio de um IAC dá abertura para a possível concessão do que pede a empresa ao final do julgamento, o que significaria desobedecer a legislação brasileira e atropelar o Poder Legislativo, configurando ativismo judicial.

Caso o STJ chegue a liberar o plantio e determinar que outros tribunais façam o mesmo, também estaria desprezando todos os argumentos em discussão no Congresso sobre os riscos para a saúde e de segurança pública em permitir a plantação da cannabis no Brasil. Entre eles estão a falta de evidências científicas sobre os benefícios medicinais de produtos com elementos da maconha (com exceção de alguns indícios para certas enfermidades), a dificuldade de fiscalização por parte do poder público de plantios clandestinos, entre outros.

Em 2019, a Anvisa liberou a importação dos extratos de canabidiol e THC, retirados da cannabis, para a fabricação de produtos no Brasil. Na época, a agência definiu que esses compostos seriam marcados com tarja preta devido ao risco de dependência, aumento de tolerância (necessidade de ingerir quantidades cada vez maiores para ter o mínimo efeito desejado) e intoxicação.

Justificativas do STJ para assumir a decisão
No recurso especial em análise no STJ, a DNA Soluções em Biotecnologia pede autorização para plantar a variante hemp da maconha. Para justificar o pedido, que afronta a Lei de Drogas, a empresa alega que esse tipo de cannabis produz THC em níveis baixos e CDB em grandes quantidades. O THC é a substância química que causa efeitos psicotrópicos, enquanto o CDB traria a esperança de possíveis efeitos medicinais, ainda não consolidados.

Antes de chegar ao STJ, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), ao analisar o caso, julgou de acordo com a Lei de Drogas. O TRF4 recordou à empresa que a lei brasileira proíbe a plantação de cannabis. No julgamento, os desembargadores afirmaram que a ampla autorização do plantio de maconha nesses casos seria matéria eminentemente política, não cabendo ao Poder Judiciário intervir nessa esfera para atender a interesses empresariais.

A empresa, então, recorreu ao STJ e teve o apoio da relatora designada para a ação, a ministra Regina Helena Costa, cujo voto foi usado como fundamento para a proposta de IAC. Para ela, o alto custo de importação do princípio ativo da cannabis justificaria a autorização do plantio para empresas. Ao mesmo tempo, ela opinou que essa medida não traria risco de emprego dos elementos da cannabis para a produção de entorpecentes. Ou seja, para ela, o poder público seria capaz de fiscalizar as plantações de modo a coibir cultivos clandestinos de outras variantes e o desvio da atividade para finalidades criminosas.

Em prol da IAC, a ministra declarou que seria “relevante avaliar se a vedação ao cultivo e à exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraídas ou produzidas drogas (artigo 2º da Lei 11.343/2006) também alcança as culturas que produzem diminuta concentração de THC e, por conseguinte, não são empregadas na criação de entorpecentes”. Avaliação essa que, segundo o previsto na Constituição, deve ser feita pelos outros poderes, Executivo e Legislativo. (Gazeta do Povo)